Cidade para as mulheres: a mulher negra no espaço público

Na última quinta-feira, 28/1, realizamos uma roda de conversa sobre mulheres no espaço público: quais as diferenças nas formas de circular, as barreiras para essa circulação e como podemos tornar nossas cidades mais inclusivas. O debate teve a presença de Bárbara Lopes, do Coletivo Arrua; Carla Vitória, da Marcha Mundial das Mulheres; Gabriela Kato, do coletivo Pedalinas; e Jeanne Callegari, do Festival Desamélia – além das pessoas presentes na praça. Veja abaixo o vídeo com o debate.

A blogueira Stephanie Ribeiro, que milita no feminismo negro e é estudante de arquitetura e urbanismo, não pôde comparecer, mas enviou uma contribuição. O texto foi lido na atividade e também o publicamos a seguir:

A mulher negra no espaço público

Por Stephanie Ribeiro

Peço desculpas por não poder comparecer.

Primeiro é extremamente necessário fazer o recorte racial, nós negras ainda somos maioria entre as mulheres mais pobres do país, as com menos estudos e a com pouca representatividade em várias esferas desde a midiática até a política.

Isso causa consequências sobre todas nós!

O que temos são estudos americanos que dizem que os assédios direcionados a negras tendem ser mais agressivos, como não havia dados nacionais, perguntei em grupos de feminismo negro. Gostosa, é pouco perto do que falam sobre nós. Alguns homens chegam a abrir as portas dos seus carros e me convidar para entrar. Isso já aconteceu mais de uma vez, a situação era recorrente, desde falarem coisas super hiperssexualizantes como se referindo a nossos órgãos sexuais aos gritos na rua, como essas situações onde se força algo.

Além disso, nos meus estudos dentro do urbanismo, li numa determinada tese de uma professora da Mackenzie que posso disponibilizar, que mulheres negras em áreas como favelas ocupam as piores áreas, ou seja, no espaço já marginalizado a mulher negra está na pior da pior ficando perto das áreas de deslizamento, por exemplo, já que ela recebe os piores salários, dentro da pirâmide econômica, mesmo as que ascendem socialmente têm salários menores do que homens brancos, mulheres brancas e homens negros, ocupando o mesmo cargo.

A negra é a mais pobre, é a maioria do país (somos 26% da população brasileira) que tem grandes áreas marginalizadas, é a que tem menores salários, e dentro disso tudo é a que mais sofre com o péssimo urbanismo das nossas cidades, o que justifica o que afirmei acima.

Falta-se moradia, nós acabamos ocupando as piores áreas. Se em épocas de chuvas as cidades inundam, se ocorre deslizamento, se falta creches para crianças, se a tarifa aumenta, todos esses e mais inúmeros problemas acabam caindo sobre os ombros das mulheres negras, devido nossa situação socioeconômica. O problema é que muitos esquecem disso e acabamos até dentro dos movimentos de esquerda não tem representatividade.

Recortando o caso do transporte público somos as maiores usuárias e não preciso lembrar que além das péssimas condições e valores altos, ainda estamos expostas as situações de assédio. E não um vagão rosa e um ônibus rosa, que isso vai mudar.

O nosso corpo negro carrega cicatrizes do racismo a anos, e nós devido a isso sofremos a intersecção da opressão machista e racista. O corpo da mulher é visto como público, o da negra além disso é visto como o corpo da “mulata exportação”, o que acontece com nós não causa comoção, o fato das cidades estarem cada vez se tornando espaços individualistas e opressores nos têm como grandes vítimas.

Afinal até mesmo para discutir as cidades, nós nem somos protagonistas. Dentro do meu curso vejo o interesse social, mas não vejo a voz do meu povo e das minhas iguais sendo realmente ouvidas.

Queria terminar esse texto com uma frase que eu gosto muito:

“A capacidade de usar o território não apenas divide como separa os homens, ainda que eles apareçam como se estivessem juntos”. Milton Santos.

 

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